segunda-feira, dezembro 12, 2005

[9º Concurso Maldito (é, da outra vez eu me enganei. O último foi o oitavo.). Tema: Desigualdade Social]

Gente.

De minha altura, que certamente prá alguns ultrapassa os meus precisos cento e setenta e três centímetros, essas pessoas me parecem diminuídas. Como se o sofrimento que elas carregam sob as costas fosse tão grande que, aos poucos, os joelhos se curvariam ao peso do martírio e as cabeças inclinariam-se ao chão, denunciando que orgulho ali já não existe; perdeu-se nas esquinas sujas, nas mãos estendidas, nos furtos, nas fomes.
Quando meus cílios pesados de rímel deixam meus olhos abertos, eu vejo olhos cinzas nos rostos dessas pessoas. Vejo uns olhos que parecem pedir desculpa pelo que ainda não foi feito, uns olhos que passeam por todo o meu redor mas nunca miram minhas pupilas diretamente. Eu vejo lágrimas contidas, que, por estarem ali há tanto tempo, acostumaram-se à idéia de nunca irromperem os limites das pálpebras, e congelaram-se, tornando turva a visão e opaco o olhar.
Minhas mãos lisas, que não sabem manusear nada além de canetas e lápis, parecem ofender a aspereza daquelas palmas calejadas, de quem já fez de tudo um pouco e não pôde se dar ao luxo de indagar-se se aquilo ali dava-lhe prazer. Costas de mãos já salgadas de tanto limpar suor de testas, unhas sujas de trabalho e ainda assim, mãos que se postam em oração, prá agradecer o que não há, e suplicar, implorar, mendigar pelo que nunca deveria ter faltado.


Não são só corpos sujos, olhos baixos de vagabundo que não quer trabalhar, mãos ásperas que atrapalham um passeio quando se esticam em pedido. Não são só uma pedra atirada à sua redoma de vidro, ameaçando quebrar sua estabilidade ricamente construída; são corpos, são olhos, são mãos, são, sobretudo, pessoas, injustamente já tão afundadas em desespero, ausência, dor e desgraça.

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