terça-feira, setembro 06, 2005

[Retrato] (não necessariamente pra Iaiá.)

Que a perna dele, suja e peluda, entrelaçava as coxas dela, não menos sujas, contudo menos peludas, isso eu via. Mas o cheiro de mijo e marginalidade que aquele enlace exalava, isso aí era coisa de se sentir.
Os ossos das costas pareciam querer furar a camisa amarela da mulher e fugir prá outro lugar - eram alvos demais prá suportar tanta imundície - mas uma mão de nós calejados e textura áspera os acariciava, como se dissesse que ficassem por ali mesmo, que era lugar conhecido há tempos, que era onde eles cabiam direito.
Havia olhos - se há contato eles sempre estão lá - e eles se encontravam. Dum brilho meio fosco, não admira que fossem cinza, dum reflexo de insanidade abandonada tempos atrás [ou horas, ou anos.]. E se as pupilas perdidas umas nas outras diziam algo, a cortina de sujeira que os separavam do resto do mundo não permitia distinguir o que era.
Se demoravam e se namoravam ali, em quarto se mquatro paredes, em cama de cobertor roto - e só o cobertor. E era como se calados e perdidos na desgraça um do outro se encontrassem, prá tornar a se perder do mundo que os cospe os rejeita porque eles não são limpos e decentes como convém.

Da sujeira que se encaixava como vingança e contestação involuntária. Do amor ou da conveniência - isso aí não me deixaram perceber. Dum casal abraçado no chão da praça. Disso tudo eu fiz um retrato.

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