segunda-feira, agosto 29, 2005

Catártico

Parco porco presto e morto
Posto fosco
Escravo fraco
Frágil a voar por entre correntes duplas e compotas de putas frescas e macias e tenras

Por noites escuras a achar que é gente
Por ruas frias a pensar que é potro
A correr a galopar e tropeçar e tropeçar
Sangue misturado ao vômito e suor e ranho e porra e escória escorre pelas pernas
E a sanidade vai como mijo pela cueca

E se é e se não é
E se pode não balança com as patas na'lgibeira
Embriagado de luar a imaginar o mar que nunca viu nem nunca virá enquanto passagem for coisa de burguês

Mergulha
Em feiúra quando diz que é
Duplo
(e)
Mergulha
Em dobro
Mergulha
Mais de uma vez
Mergulha
(aos montes)

Mas volta seco de pó
Secado em feiúra
Pecado
De impuro de incasto de inútil
Flagelo
Na pele tem talho de ato
Falho sempre ao tentar ser errôneo
Um lado de culpa e outro de dedo que aponta
Busca solução e torna a mergulhar na feiúra de

Achar que estava em Drummond em Bandeira em Rodrigues em Lispector e se viu no espelho
Nu como o mais nu dos nus
Cheio de pêlos que pelos peitos escorriam como se quisessem fugir pelos ombros
(que não suportam um mundo, nem ao menos uma farpa de mundo)

E se fosse homem se fosse forte se fosse alguém
(alguém de algum país de alguma cidade de alguma rua de alguma casa)
Se fosse alguém teria dado cabo ao cabo
Enrolado no pescoço e jogado pela janela

Mas não é ninguém é dos fracos não é macho
(e nem sabe onde é que fica e quem paga e quem habita a casa em que dorme todo dia)
Não há cacife para acabar com coisa nenhuma
Quem dirá com esse martírio que chamam de vida e que empurram como se dele fosse

Infecundo feto de um mundo que gira noite e dia
E as horas passam como o trem que passa todo dia às oito horas a acordar os pobres que foderam a noite inteira
E como tratores esmagam qualquer pio de diferença e brilho
E todo moralismo recai sobre o chapéu do sertanejo deslocado no êxodo de sessenta e seis

E não é apatia falta de propósito ou de tentativa
É que o que é se escancara demais e persegue até no canto mais teu em que se busca esconder
O cotidiano não se solta dos olhos, só salta até eles
Do menino que acata às ordens de se segurar dentro do ônibus, do sopapo que a puta levou no pé do ouvido, das mãos sujas e da mente leve do despudorado
Da vida não se escapa

E pelo tempo a escoar as rugas a nascer e esfarelar ossos e prédios
Por esgotos a cair e levar pura merda com pedaços de milho amarelo-ouro
Comendo banana-maçã e laranja-pêra a imaginar quão doce era a p a m o n h a f r e s q u i n h a p a m o n h a da infância no norte
Com o eterno fardo da vida
Deu o tiro e não morreu

Lara Spagnol e Rafael Romero



[Conversas de Msn no domingo à noite às vezes dão frutos.]

Sem comentários:

Enviar um comentário